Finanças comportamentais: #6 – Viés de confirmação

Imagem de hainguyenrp por Pixabay.

Qual foi o time de futebol que conquistou o Campeonato Brasileiro de 1987? Uma certeza é que foi um rubro-negro. Mas, se você for torcedor do Sport, não terá dúvidas de afirmar que foi o time pernambucano que levou a parada, ainda mais depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou isso em 2018, após longos 31 anos. De outro lado, sendo você flamenguista, não faltarão argumentos para afirmar que foram os cariocas que levaram a conquista. A questão é tão controversa que, não por acaso, essa tem sido uma das grandes polêmicas do futebol brasileiro.

Quando se está convicto de algo, mesmo que não totalmente cercado de fatos que o sustentem no campo da verdade, há uma tendência a buscar elementos para validar tal crença. A isso se denomina “viés de confirmação”, que Gelfert (2018) considera como a tendência quase universal a favor de novas evidências que confirmem nossas teorias e crenças já existentes. Ou seja, se você acredita que algo é verdade, tenderá a dar mais valor a argumentos que reforcem essa “verdade”, mesmo que ela não passe de uma ficção.

Em tempos de Fake News, não importa no que se acredita, no que é verdade ou mentira, sempre se encontrará elementos para justificar as posições e escolhas de pensamento. Ou seja, quaisquer que sejam as crenças, haverá argumentos para defendê-las, por mais infundados que esses argumentos possam ser. E isso pode ser um problema! Vide o ambiente político brasileiro atual. Está muito difícil saber quem está do lado da verdade, uma vez que um ambiente polarizado e contaminado pelo viés de confirmação, por uma mídia supostamente tendenciosa e por uma sempre presente teoria da conspiração ofuscam a capacidade interpretativa das pessoas, especialmente a daquelas mais ingênuas.

A fluorescência das notícias falsas, especialmente no ambiente ágil e onipresente da internet, tem trazido à tona questões antes assumidas como “verdades absolutas” para o campo do questionamento conspiratório. Anos atrás, ainda nos anos 1990, conversava eu com um homem simples e religioso (Seu Antônio, como era conhecido) sobre a ida do homem à lua, ao que ele me interpelou com um “alto lá!”, esbravejando que eu não deveria tentar colocar o homem acima de Deus, ao considerar questão tão absurda. O homem não poderia pisar à lua, terreno acessível apenas a Deus, acreditava Seu Antônio. Em respeito àquele homem de mais de setenta anos, encerrei o assunto.

Depois de tantos anos, a questão segue em aberto para muitas pessoas, que duvidam que de fato a viagem à lua aconteceu e para as quais as imagens e vídeos publicados não passam de uma montagem cinematográfica, filmada nos desertos norte-americanos. Se essa for sua crença, mesmo que o nobre e inocente Seu Antônio já não esteja mais entre nós, não faltarão elementos no ambiente virtual e mesmo entre diversas pessoas para confirmar sua crença e fazê-lo seguir firme com essas convicções.

Se uma simples discussão sobre campeonatos de futebol e a ida do homem à lua não traga tantos estragos assim à vida das pessoas, quando muito discussões acaloradas aqui ou ali, não se pode dizer o mesmo do uso de vieses confirmatórios para fazer julgamentos quanto ao futuro de uma pessoa em um processo de seleção de emprego ou àquelas que tenham sido injustamente acusadas de um crime. O viés de confirmação pode levar entrevistadores de emprego a formarem um conceito sobre determinado candidato antes mesmo de ele ser ouvido, conduzindo a entrevista para a “confirmação” de seus conceitos prévios, muitos dos quais, literalmente, preconceituosos. Estudo de Araújo e Pilati (2014) mostra como o viés de confirmação pode influenciar os resultados de processos seletivos. Assim como Freitas (2020) traz a discussão sobre o viés de confirmação no ambiente jurídico.

O viés de confirmação está presente em diversos aspectos e ambientes decisórios. Muitas vezes, sua manifestação é sutil e despercebida, podendo ser identificado tardiamente, já tendo deixado seus efeitos negativos como resultado. Um exemplo disso ocorre quando uma pessoa pensa em montar uma empresa. Dificilmente alguém pensará em investir em um negócio no qual não tenha uma ideia prévia ou crença positiva. Ou seja, deseja-se montar um negócio no qual se acredita previamente. Então vem a pergunta: para que fazer um estudo de mercado ou um estudo de viabilidade? Em tese, para verificar se as premissas encontram amparo na realidade. Mas e se o contratante do referido estudo estiver apenas buscando “confirmar” o que sua crença inicial já tomava como verdade? O estudo não servirá para nada, especialmente se apresentar um resultado divergente, o qual será prontamente desqualificado pelo candidato a empresário que está sob o encanto do viés de confirmação.

Por mais que nem sempre o viés de confirmação se mostre incoerente, sendo a crença inicial algumas vezes validada pelos fatos, o que se está considerando aqui é que o risco de se cometer equívocos grosseiros e até mesmo injustiças que levem à perda de dinheiro, e até mesmo de vida pelas pessoas, é enorme. Desse modo, a melhor forma de se vacinar contra os efeitos colaterais do viés de confirmação é não assumir uma posição firme e imutável sobre aquilo que você desconhece, ainda que parcialmente.

Falando em vacina, não faltam conspiradores argumentando que as vacinas contra o coronavírus não passam de um truque para empresas ganharem dinheiro das pessoas e que elas, as vacinas, estão levando muitos à morte, inclusive. Ainda que todas as evidências mostrem o contrário, de que quem está realmente morrendo em maior escala sejam os não vacinados, o que dizer a esses que buscam diariamente em notícias falsas alimentar seu viés de confirmação?

E você, já conhecia o viés de confirmação e seus poderosos efeitos sobre o processo decisório? E mais, já se viu envolvido pelos sussurros furtivos dessa disfunção cognitiva? Enquanto pensa a respeito, continue acompanhando nossa série sobre finanças comportamentais e aproveite para deixar seus comentários sobre o que está achando a respeito. Só tome cuidado com o viés de confirmação ao tecer seus comentários.

 

Robson Braga
Sócio-fundador da BR2 Consultoria Empresarial
Professor de Finanças da Universidade do Estado da Bahia

 

  • Araújo, M. E. B. D. O., & Pilati, R. (2014). Viés de confirmação em entrevista de seleção: evidências em estudantes universitários. Revista Psicologia Organizações e Trabalho14(1), 67-77.
  • Freitas, M. S. (2020). Juiz das garantias, a prejudicialidade do princípio da identidade física do juiz sob a ótica do viés da confirmação. PUC-GO.
  • Gelfert, Axel. Fake News: A Definition. Informal Logic, Vol. 38, N. 1. 2018.

Redação BR2

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