Finanças comportamentais: #12 – O excesso de confiança que nos engana

Imagem de Tumisu por Pixabay

Ainda intriga a humanidade a sua própria origem. Seja pela linha criacionista ou evolucionista, a verdade é que se sabe muito pouco sobre o processo evolutivo do homem ao longo do tempo e muita discussão ainda impera com ar, com questões sem respostas exatas. Ainda mais intrigante, talvez, seja o fato de não se ter muito noção do que significa viver e para onde se vai após encerrar esse processo que se denomina vida. Dessa forma, se uma reflexão mais contida for feita, é provável que se flerte com a loucura.

É provável que a humanidade, na média, viva de maneira um tanto aleatória, em um ruminante processo de fazer tudo sempre igual ou quase sempre, conforme se acostuma a dominar a rotina geralmente enfadonha que se escolhe para si. Uma pequena coleção de indivíduos realmente diferenciados permitiu que a evolução tomasse de assalto os homens e mulheres que passaram por aqui nos últimos 500 anos. Parte dessa revolução está nos processos produtivos e tecnológicos. Desde o ano de 1500, a população mundial cresceu 14 vezes, a produção 240 vezes e o consumo de energia 115 vezes[i].

A ciência é a grande protagonista desse processo de evolução. A partir do reconhecimento essencial de que não sabemos tudo, o questionamento levantado pelo método científico (sem dúvida, uma das grandes revoluções da cognição humana) procura respostas por meio de um dinâmico processo de a tudo questionar. Questionar tudo não significa ser desprovido de crenças, mas sim de não as assumir, necessariamente, como certezas absolutas (pleonasmo proposital).

Feita essa ponderação filosófica, o que se quer destacar é que é preciso reconhecer os limites do conhecimento e considerar que algumas crenças podem se revelar totalmente falsas, uma vez submetidas aos ditames do método científico. Nos processos decisórios, as simples crenças de que se está fazendo a coisa certa e que “temos muita experiência” nisso ou que “faço isso há vinte anos”, pode levar a resultados desastrosos se as regras do ambiente tiverem mudado ou se os sucessos anteriores forem mero fruto da sorte e não do talento que se imaginava deter.

A crença na própria capacidade para tomar decisões ou obter resultados acima da média é típica dos que se veem rendidos ao excesso de confiança (overconfidence effect[ii]). Os superconfiantes costumam demonstrar arrogância perante os demais e parecerem infalíveis. Dedicam pouco tempo aos estudos, por acreditarem já saberem o suficiente. Um chefe excessivamente confiante dificilmente será visto em uma sala de treinamento com sua equipe. No máximo fará uma fala de abertura e, sem rodeios, assumirá motivos superiores para não ficar mais, mesmo que seu compromisso seja apenas com a piscina de casa.

Será incomum ver alguém excessivamente confiante reconhecer erros ou falhas. Ele estará pronto para colocar a culpa em qualquer um que esteja à sua volta. É também difícil vê-lo elogiar alguém, exceto para reconhecer que o sucesso do outro foi devido às contribuições ou conselhos que ele lhe deu. Dizer que não sabe algo é demonstração de fraqueza dos muito confiantes. Preferem inventar estórias ou contar lorotas, que não fazem o menor sentido, para tentar demonstrar erudição. Se descoberto, terá sido um equívoco fortuito, para o qual dirá que não se lembra de ter dito tal coisa.

Os excessivamente confiantes costumam desaparecer quando as suas apostas não estão sendo premiadas, aparecendo “do nada” para comemorar sua capacidade “acima da média”, quando o acaso o premia com alguns acertos. Em um jogo com moedas, escolher cara ou coroa fará com que em algum momento se acerte. Mas os excessivamente confiantes não pensam dessa forma e consideram que o seu talento inato o dá uma capacidade superior aos demais, assumindo para si o mérito pertencente à sorte.

É praticamente impossível alguém não conhecer pelo menos uma pessoa com esse perfil. Elas estão por todos os lugares, nas empresas, no mercado financeiro, nas instituições de ensino e talvez até em sua casa, quem sabe em seu espelho. Fique atento aos riscos do excesso de confiança. Ainda que seja preciso reconhecer as competências próprias, não acredite que elas sejam superiores ao universo de conhecimento ainda há para ser desbravado e creia que aquele sujeito a quem não “se dá nada” pode demonstrar uma capacidade de contribuição que não se poderia imaginar. Enfim, resgatando os destaques iniciais deste artigo, no dia em que a humanidade puder explicar o universo e a vida estará realmente em condições, talvez, de subir no palco da soberba. Ou melhor, nem assim!

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Com esse último artigo, chegamos ao fim da série de Finanças Comportamentais. É preciso destacar que apesar de termos trazido diversos assuntos ligados a esse fantástico contexto teórico, que demonstra o quanto somos limitados em termos de capacidade cognitiva e influenciados por nossas emoções e sentimentos, ficamos longe de esgotar os temas deste vasto campo de estudos.

De todo modo, esperamos que as provocações trazidas ao longo dos doze artigos que publicamos possa, de algum modo, contribuir para sua reflexão sobre os processos decisórios ligados às finanças pessoais e empresariais. Reconhecer nossas limitações é um bom ponto de partida para buscarmos ainda mais conhecimento. De minha parte deixo registrado o tão pouco que domino sobre o fantástico mundo das finanças e isso me alimenta de energia para buscar conhecer um pouco mais. Que assim seja contigo também, de modo a trilharmos juntos essa estrada no saber e nos encontramos em alguma esquina, onde discutiremos sobre os vales e montanhas que trilhamos até agora. Que assim seja! Que a felicidade seja uma constante em sua vida, especialmente pelas belas decisões que ainda tomará ao longo dos teus dias. Um abraço fraterno.

 

Robson Braga
Sócio-fundador da BR2 Consultoria Empresarial
Professor de Finanças da Universidade do Estado da Bahia

 

[i] Harari, Y. N. (2018). Sapiens: a brief history of humankind by Yuval Noah Harari.

[ii] Moore, D. A., & Healy, P. J. (2008). The trouble with overconfidence. Psychological review, 115(2), 502.

Redação BR2

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