Evite decisões de manada em 2020

Evite decisões de manada

Já parou para pensar sobre algumas decisões que você toma ou coisas que faz hoje que não sabe o porquê as escolheu? Onde você trabalha, onde e com quem vive, o que faz e até mesmo o que come e bebe? Na verdade, não estamos falando necessariamente de escolhas, mas provavelmente das “não escolhas”. Boa parte das coisas que você faz atualmente não é resultado exatamente de escolhas que você fez, mas do fato de ter deixado de escolher ou simplesmente deixado as coisas correrem como estavam.

Em um estudo relevante no campo das finanças, Samuelson e Zeckhauser (1988)1 afirmam que todas as decisões que tomamos têm sempre uma alternativa em comum, a do status quo. Essa opção diz respeito a simplesmente “não fazer nada” ou “manter uma decisão anterior em curso”. Dito dessa forma, pode parecer complicado de entender, mas vejamos um contexto hipotético: você trabalha em uma empresa e recebe uma proposta de trabalho, aparentemente melhor, para se mudar para outra cidade. Por mais que você pondere o quão interessante pode ser essa mudança, a opção de ficar onde está é uma forte concorrente, pois você pensa: “aqui eu já conheço tudo, tenho minha casa, amigos, filhos na escola…”. Enfim, a opção de deixar tudo como está provoca você a se manter no conforto do cenário atual.

Resgatando um estudo ainda mais datado, em seu livro sobre fundamentos dos estudos estatísticos aplicados à decisão, Savage (1972) destaca que um processo racional de escolha exige que o indivíduo avalie as probabilidades dos possíveis resultados e calibre os seus benefícios (que em economia denomina-se utilidade), selecionando a opção que oferece os mais altos resultados esperados (highest expected utility). As teorias comportamentais vão discutir o quanto isso é complicado, senão uma bela utopia, dada a racionalidade limitada dos indivíduos, mas essa é outra história.

No caso da presente discussão, vamos sinalizar que analisar as opções disponíveis e decidir pela melhor (ainda que não se saiba bem o que isso queira dizer) exige muito tempo e esforço. Imagine, então, receber isso pronto! Já pensou se todas as escolhas que você fosse tomar já tivessem sido supostamente analisadas por outras pessoas que te entregassem prontas as caixinhas para você abrir? Bingo! Seus problemas de decidir e escolher estariam resolvidos! Pois saiba que isso está existindo nos dias de hoje e talvez você seja um dos consumidores dessas “soluções fantásticas”.

Como caixinhas mágicas que carregam tudo o que precisamos dentro de si, o mercado está cheio de soluções prontas para escolhermos, mesmo que elas não tenham nada a ver com o nosso perfil, desejos e resultados almejados. Mas elas têm uma grande e miraculosa virtude: são rápidas, práticas e até mesmo baratas, senão “gratuitas”. Estamos falando das diversas opções de “como ganhar dinheiro”, “como perder peso”, “como fazer amigos”, “como ser feliz” e tantos outros “como” que saltam aos nossos olhos todos os dias, especialmente nas redes sociais e na internet como um todo. Com isso, vamos seguindo com as chamadas “decisões de manada”, aquelas que estão sendo tomadas por “todo mundo”.

Fala sério, você não está fazendo aquele investimento? Não está participando daquele curso? Não está assistindo aquela palestra? Está por fora do último sucesso do momento? Enfim, não está fazendo o que todos estão? Quem é você, afinal? Que não está junto à manada? Que não está por dentro da “última moda”? Que decidiu analisar por sua conta e risco o que é melhor para você?

Samuelson e Zeckhauser (1988) afirmam que apenas as características relevantes vão direcionar as escolhas dos indivíduos frente às opções disponíveis. Nesse caso, há algo de mais relevante do que o resultado positivo, o sucesso? Os vendedores das caixinhas sabem disso e colorem de dourado as opções que desejam que sejam escolhidas pela maioria. Desse modo, o caminho da manada é apresentado como mais largo e tem um oásis no seu fim, e não o longo deserto que as demais opções parecem demonstrar.

No contexto atual, manter-se no status quo pode ser a melhor opção, dirão os decisores de manada, se essa for a escolha da maioria. Contudo, se você se descobrir comendo areia enquanto achava que estava bebendo água fresca na lagoa do oásis, a culpa é sua, que não enxergou que a manada já seguiu por outro lado, dirão os séquitos. Pode ser, contudo, que a água da lagoa esteja já poluída, de tantos que já se banharam nela. Nesse caso, a culpa é sua, que não zelou pela manutenção desse ambiente fértil, que talvez nunca tenha existido.

A grande verdade é que boa parte dos que estão provocando a manada para o suposto “mundo perfeito” não está lá. Está, sim, na grande sala de mesa farta, onde deveria estar sendo servido um banquete para todos aqueles que fizeram suas escolhas por vontade e devoção, a comer sozinho aquilo que deveria ser de todos. Não se deve discutir sobre culpas nessa história, pois o resultado disso tudo deriva da escolha pelo status quo, a decisão de não decidir ou de não escolher por si mesmo e sim de entregar, a quem quer que seja, o poder de indicar o que é melhor, mesmo que isso signifique escolher o que é bom só para o outro.

2020 está chegando! E você, vai começar a decidir por si mesmo ou vai seguir decidindo não decidir ou escolhendo adquirir, pelo custo de sua vida, as “caixinhas mágicas” que todos os dias são ofertadas no mundo das ilusões fortuitas? Que tal aproveitar os últimos dias do ano para pensar a respeito? Felizes decisões para todos no Ano Novo, sabendo que elas gostam de ficar escondidas nos melhores lugares, mesmo que seja embaixo do nosso nariz!

Robson Braga

Sócio-fundador da BR2 Consultoria Empresarial
Professor de Finanças da Universidade do Estado da Bahia

  • Samuelson, W., & Zeckhauser, R. (1988). Status quo bias in decision making. Journal of risk and uncertainty1(1), 7-59.
  • Savage, L. J. (1972). The foundations of statistics. Courier Corporation.

Redação BR2

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